Quatro homens e uma mulher são testemunhas de uma morte necessária... O animal está ali, na mesa, com o peito exposto para cima, com cada pata calçada. A daga invade o peito e fura o coração. O berro é forte e agonizante, como se a alma fosse desgrudada do corpo.
As pessoas se entreolham no momento em que cessam os gritos e os movimentos do animal e, como num código predefinido, começa o serviço. As patas são imersas em uma cambona de água fervendo pra "desabotoar os cascos". A raspagem dos pelos é feita por todos, ao mesmo tempo. O suíno precisa estar limpo para ser aberto e desmembrado.
A daga, que lhe matara há poucos instantes, agora abre o peito e a barriga. As vísceras são retiras, o sangue é todo recolhido. A carne é separada, a banha (ou toucinho) e a pele também são reservadas. Cada parte do corpo do porco tem uma utilidade: as patas, as orelhas e a pele viram ingredientes pro feijão. O toucinho vira banha e torresmo. A carne pode ter três destinos: consumo de subsistência, linguiça ou comércio. O que sobra vira queijo, morcela ou charque.
Diz o ditado popular que, do porco, só não se aproveita o grito. Mas, de certa forma, o berro também é aproveitado - para entender sobre a morte do próprio porco. Principalmente por aqueles que não estão acostumados com a lida da campanha; que não entendem que a morte, às vezes, é imprescindível para a sobrevivência dos campesinos.
No interior do município de Encruzilhada do Sul, ainda existem lidas quase artesanais, como as carneadas. O que pra uns pode parecer uma brutalidade, para outros, é uma prática que faz parte do cotidiano. A partir daquele grito de agonia , começa o serviço. O serviço garante a subsistência. Quatro homens e uma mulher são testemunhas de uma morte necessária...
Tem gente que se diz horrorizada, mas não perde um churrasco de domingo.
ResponderExcluirisso aí... hipocrisia pura!
ResponderExcluirTão bem escrito e descrito, que os pormenores me tocaram profundamente.Digo à mim mesma que preciso parar de comer carne, como posso defender alguns bichos e comer outros? Mas uma coisa já sei, vou começar minha jornada do abandono desse hábito, pelo porco. Assim te devo um muito obrigado e coitado dos porcos que já comi.
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